Após a leitura do texto, leia as perguntas propostas. Você
perceberá que algumas questões incidem sobre o conjunto do texto: estas podem
ser respondidas diretamente. Mas há outras questões que incidem sobre trechos,
sobre passagens específicas do texto: estas, para serem respondidas, exigem uma
volta ao texto.
Quando a prova é de questões discursivas, expositivas, temos mais liberdade
para encaminhar nossas repostas. Nesse caso, é preciso muita atenção quanto ao
enunciado, para que você responda realmente o que está sendo pedido e não
incorra nos erros clássicos de entendimento de texto, que são basicamente três:
extrapolação, redução e contradição. Reconhecer estes erros, conhecer o
processo lógico que ocorre em cada um deles, é de importância vital para superara-los,
ou seja, para que nossas respostas sejam claras e coerentes, adequados aos
textos.
Extrapolação
O erro de extrapolação, como o próprio nome indica, acontece quando saímos do
contexto, quando acrescentamos ideias que não estão presentes no texto. Ao
extrapolar, vamos além dos limites do texto, viajamos além de suas margens,
fazemos outras associações, evocamos outros elementos, criamos a partir do que
foi lido, deflagramos nossa imaginação e nossa memória, abandonando o texto que
era o nosso objeto de interpretação.
A extrapolação é muitas vezes um exercício de criatividade inadequada - porque
nos leva a perder o contexto que está em questão. Geralmente, o processo de
extrapolação se realiza por associações evocativas, por relações analógicas:
uma ideia lembra outra semelhante e viajamos para fora do texto. Outras vezes,
a extrapolação acontece pela preocupação de se descobrir pressupostos das ideias
do texto, pontos de partida bem anteriores ao pensamento expresso, ou, ainda,
pela preocupação de se tirar conclusões decorrentes das ideias do texto, mas já
pertencentes a outros contextos, a outros campos de discussão.
Reconhecer os momentos de extrapolação - sejam analógicos ou lógicos -
significa conquistar maior lucidez, maior capacidade de compreensão objetiva
dos textos, do contexto que está em questão. Essa clareza é necessária e é
criadora: significa, inclusive, uma liberdade maior de imaginação e de
raciocínio, porque os voos para fora dos textos tornam-se conscientes, por
opção, serão realizados por um projeto intencional, e não mais por incapacidade
de reconhecer os limites de um texto colocado em questão, nem por incapacidade
de distinguir as próprias ideias das ideias apresentadas por um texto lido.
Redução
Outro erro clássico em exercícios de entendimento de texto, erro oposto à
extrapolação, é o que chamamos de redução ou particularização indevida. Neste
caso, ao invés de sairmos do contexto, ao invés de acrescentarmos outros
elementos, fazemos o inverso: abordamos apenas uma parte, um detalhe, um
aspecto do texto, dissociando-o do contexto. A redução consiste em
privilegiarmos um elemento (ou uma relação) que é verdadeiro mas não é
suficiente diante do conjunto, ou então que se torna falso porque passa ser
descontextualizado. Prendemo-nos assim, a um aspecto menos relevante do
conjunto, perdendo de vista os elementos e as relações principais, ou antes,
quebramos este conjunto, fracionando inadvertidamente esse aspecto, isolando-o
do contexto. Reconhecer os processos de redução representa também um salto de
qualidade em nossa capacidade de ler e entender textos, assim como em nossa
capacidade de perceber e compreender conjuntos de qualquer tipo, reconhecendo
seus elementos e suas relações.
Contradição
O último erro clássico nas interpretações de texto, o mais grave de todos, é o
da contradição. Por algum motivo - uma leitura desatenta, a não percepção de
algumas relações, a incompreensão de um raciocínio, o esquecimento de uma ideia,
a perda de uma passagem no desenvolvimento do texto - chegamos a uma conclusão
contrária ao texto. Como esse erro tende a ser mais facilmente reconhecido -
por apresentar ideias opostas às ideias expressas pelos textos - os testes de
interpretação muitas vezes são organizados com uma espécie de armadilha: uma
alternativa apresenta muitas palavras do texto, apresenta até expressões
inteiras do texto, mas com um sentido contrário. Um leitor desatento ou/e
ansioso provavelmente escolherá essa alternativa, por ser a mais “parecida” com
o texto. Por ser a que apresenta mais literalmente, mas “ao pé da letra”,
elementos presentes no texto...
Exercício/ exemplo
Vamos ver alguns exemplos de erro - extrapolação, redução, contradição - a
partir de textos em prosa e em poesia. Muitos destes exemplos são colhidos em
experiências de aula de interpretação. Ao aprender a reconhecer os erros, você
vai desenvolvendo uma clareza maior para sua prática de interpretar mais
lucidamente os textos. Perceba, também, como o resumo e a paráfrase são
utilizados durante o processo interpretativo.
Leia atentamente o texto que se segue. Faça a primeira leitura, a de entrar em
contato, e, depois, faça a segunda leitura, captando as ideias centrais.
Procure fazer um pequeno resumo do texto. Em seguida, verifique se você cometeu
algum erro de extrapolação, redução ou contradição.
A tradição e o moderno
A tradição é importante. É democrática quando desempenha a sua função natural
de prover a nova geração com conhecimentos das boas e más experiências do
passado, isto é, a sua função de capacitá-la a aprender à custa dos erros
passados a fim de os não repetirem. A tradição torna-se a ruína da democracia
quando nega à geração mais nova a possibilidade de escolha; quando tenta ditar
o que deve ser encarado como “bom” e como “mau” sob novas condições de vida. Os
tradicionalistas fácil e prontamente se esquecem de que perderam a capacidade
de decidir o que não é tradição. Por exemplo, o aperfeiçoamento do microscópio
não foi conseguido pela destruição do primeiro modelo: o aperfeiçoamento foi
realizado com a preservação e o desenvolvimento do modelo primitivo a par com
um estágio mais avançado do conhecimento humano. Um microscópio do tempo de
Pasteur não capacita o pesquisador moderno a estudar uma virose. Suponha agora
que o microscópio de Pasteur tivesse o poder e o descaramento de vetar o
microscópio eletrônico.
Os jovens não sentiriam nenhuma hostilidade para com a tradição, não teriam na
verdade senão respeito por ela se, sem se arriscar, pudessem dizer: Isto nós o
tomaremos de vocês porque é convincente, é justo, diz respeito também à nossa
época e passível de desenvolvimento. Aquilo, entretanto, não podemos aceitar.
Era útil e verdadeiro para o seu tempo - seria inútil para nós. E esses jovens
deveriam preparar-se para ouvir dos seus filhos as mesmas palavras.
(Wilhelm Reich - A revolução sexual)
Observe alguns exemplos de extrapolação, redução e contradição, muito frequente
na interpretação de textos.
Extrapolação: O texto fala sobre o papel dos cientistas na sociedade e sobre a
importância da ciência para a democracia, que é o melhor sistema de governo.
Redução: O texto fala sobre a importância do microscópio, importante
instrumento de investigação científica.
Contradição: O texto afirma que a tradição sempre é um empecilho para o
desenvolvimento do conhecimento humano.
Como você vê, no primeiro caso, a afirmativa sai dos limites do texto, volta-se
para outro assunto (papel dos cientistas na sociedade, ciência e democracia).
No segundo caso, reduz-se o texto à questão do microscópio, que é apenas um
exemplo usado. No terceiro caso, conclui-se o oposto do que o texto afirma: a
tradição seria sempre um obstáculo.
A compreensão correta do texto apresentaria os seguintes elementos e relações:
a importância da tradição;
A tradição, quando é democrática fornece elementos sobre as experiências do
passado;
A tradição, quando é antidemocrática e tenta ditar o que é bom ou mau, em
diferentes condições de vida;
O exemplo do microscópio, nos dois casos.
Ao analisar um texto dissertativo, identifique inicialmente o argumento
principal, aquele que fundamenta a opinião exposta. Em seguida, identifique as
consequências decorrentes do que está sendo afirmado e por fim, a conclusão,
que é a reafirmação do argumento principal.
O mistério
O que podemos experimentar de mais belo é o mistério. Ele é a fonte de toda a
arte e ciência verdadeira. Aquele que for alheio a essa emoção, aquele que não
se detém a admirar as colinas, sentindo-se cheio de surpresa, esse já está, por
assim dizer, morto e tem os olhos extintos. O que fez nascer a religião foi
essa vivência do misterioso - embora mesclado de terror. Saber que existe algo
insondável, sentir a presença de algo profundamente racional e radiantemente
belo, algo que compreenderemos apenas em forma muito rudimentar - é esta a
experiência que constitui a atitude genuinamente religiosa. Neste sentido, e
unicamente neste sentido pertenço aos homens profundamente religiosos.
(Albert Einstein - Como vejo o mundo)
Seguem alguns exemplos de erros no entendimento do texto.
Extrapolação: O texto fala sobre a importância de Deus e da religião, e sobre o mistério da criação do universo.
O texto afirma que todo cientista precisa ser artista e religioso, para poder compreender a natureza.
Redução: O texto afirma que o terror fez nascer a religião.
O texto afirma que a nossa compreensão dos fenômenos é ainda muito elementar.
Contradição: O texto afirma que quem experimenta o mistério está
com os olhos fechados e não consegue compreender a natureza.
O texto afirma que a experiência do mistério é um elemento importante para a arte, não para a ciência.
O texto apresenta, na verdade, várias idéias básicas:
a beleza da experiência do mistério;
a emoção do mistério como raiz da ciência e da arte;
o homem incapaz de sentir essa emoção está com os olhos mortos;
a caracterização dessa vivência: saber e sentir que existe algo -
belo e racional - que compreendemos apenas rudimentarmente;
o sentido em que o autor se considera uma pessoa religiosa (e unicamente neste sentido